O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um habeas corpus impetrado pela defesa de governador de Mato Grosso, Mauro Mendes. Ele pediu o trancamento da ação penal contra ele por falsidade ideológica, supostamente em conluio com a juíza aposentada da Justiça do Trabalho, Carla Reita Faria Leal. O governador foi procurado, mas ainda não se manifestou.
Mendes é acusado da compra ilegal de um apartamento, em Cuiabá, em um leilão da Justiça do Trabalho. O imóvel foi transferido para a juíza, posteriormente.
Para o ministro Olindo Menezes, relator do recurso, a ação penal deve prosseguir regularmente porque há indícios de delitos imputados ao governador. Segundo ele, neste momento processual, é suficiente a demonstração da ocorrência do fato criminoso e de indícios de autoria, os quais serão apurados com profundidade durante o processo.
"Não se verifica a presença de quaisquer das situações que ensejam o trancamento da ação penal, restando devidamente demonstrado haver indícios mínimos de materialidade e autoria das imputações", concluiu.
Segundo o processo, em 2 de dezembro de 2009, o governador arrematou em leilão um apartamento penhorado no curso de execução trabalhista que tramitou no foro em que atuava a acusada de coautoria.
Na denúncia, foi apontada uma suposta articulação entre o governador e a juíza para inserir declarações falsas em documentos e fraudar a arrematação do imóvel, o qual, dois anos depois, teria sido transferido pelo político à magistrada, em um "simulacro de dação em pagamento".
O caso foi apurado em um processo disciplinar aberto no Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região, que concluiu que houve simulação da compra porque era a única possibilidade de aquisição pela magistrada de um imóvel objeto de leilão.
Simulação
Autor da ação, o Ministério Público Federal (MPF) considerou o negócio uma simulação para contornar a proibição legal que a magistrada teria para arrematar o imóvel, já que era servidora do TRF e ainda tinha atuado como magistrada no processo. O imóvel tinha ido a leilão para o pagamento de indenizações trabalhistas.
Ainda segundo a denúncia, os dois deram uma versão à Justiça de que Mauro teria pego R$ 300 mil emprestados com a juíza e que o imóvel seria o pagamento, mas não conseguiram comprovar o empréstimo.
A magistrada foi aposentada compulsoriamente em 2015. Ela é acusada de se aproveitar da amizade que mantinha com Mauro Mendes, à época prefeito de Cuiabá, para adquirir o imóvel. O apartamento foi arrematado pelo prefeito em 2009 e depois foi comprado pela magistrada por meio de transferências bancárias no valor total de R$ 300 mil.
Em 2018, a Justiça determinou o bloqueio de R$ 300 mil das contas do governador e da juíza aposentada. À época, o juiz federal Raphael Casella de Almeida Carvalho, da 8ª Vara Federal de Cuiabá, disse que havia indícios suficientes da existência do ato de improbidade e da participação deles no crime.
O pedido de habeas corpus foi inicialmente dirigido ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que manteve a ação penal sob o argumento de que a conduta delituosa supostamente praticada justifica o recebimento da denúncia.
No recurso ao STJ, a defesa alegou que deve ser aplicado o princípio da consunção entre os crimes de falsidade ideológica e fraude em arrematação judicial, com a consequente extinção da punibilidade, em decorrência da prescrição da pretensão punitiva.
Além disso, afirmou que a ação civil pública por improbidade administrativa relativa ao caso foi rejeitada pelo TRF1, o que revelaria a alegada ausência de justa causa para a propositura da ação penal.
Para o STJ, o trancamento da ação penal é medida excepcional, só admitida quando fica provada a atipicidade da conduta, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade ou, ainda, a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade. Nenhuma dessas condições, porém, foi verificada no caso.
O ministro Olindo Menezes pontuou que, como as instâncias ordinárias entenderam pelo não cabimento do princípio da consunção, não seria possível adotar posicionamento contrário, pois isso exigiria o reexame das provas do processo, o que é vedado na análise de habeas corpus.