Argumentos utilizados pelo governo nos últimos meses para justificar medidas provisórias enviadas ao Congresso Nacional relacionadas à pandemia do novo coronavírus contrastam com as declarações do próprio presidente Jair Bolsonaro sobre o tema.
O G1 analisou os motivos apresentados por integrantes e ex-integrantes do governo para enviar 67 MPs ao Congresso desde 20 de março – data em que foi decretado o estado de calamidade pública em razão da Covid-19.
Os textos divergem e até contradizem falas e práticas adotadas pelo presidente frente à pandemia. Bolsonaro defende a flexibilização do isolamento social e, desde abril, provocou aglomeração em diversas atividades públicas, nas quais chegou a abraçar apoiadores e conversar sem máscara com eles.
O presidente também é defensor da reabertura do comércio e disse que "talvez tenha havido um pouco de exagero" na maneira como a pandemia do novo coronavírus foi tratada. O Brasil pode atingir a marca de 100 mil mortos pela Covid-19 neste sábado (8).
Quando o vírus ainda não havia chegado ao país, mas já fazia vítimas em outras partes do mundo, Bolsonaro chegou a chamar a pandemia de uma "gripezinha" e afirmar que havia "histeria" em torno do alastramento da doença.
O presidente ainda rivalizou com governadores quando os estados começaram a adotar medidas de isolamento social e fechamento do comércio, consideradas por autoridades sanitárias, como a OMS, as mais eficazes na contenção do vírus.
No entanto, na medida provisória que abriu crédito para pagamento do auxílio emergencial a profissionais da cultura, por exemplo, o ministro Paulo Guedes reconheceu a necessidade do isolamento social e de se evitar aglomerações para a prevenção do contágio.
Em outra MP, o ministro associou uma eventual queda no número de mortes e de contaminados a medidas de quarentena e isolamento social, na contramão do que prega Bolsonaro (veja mais abaixo).
Uma medida provisória só pode ser editada pelo presidente da República. As regras previstas no texto passam a vigorar imediatamente após a publicação do conteúdo no "Diário Oficial da União", mas o texto precisa ser aprovado pelo Congresso em até 120 dias para não perder validade.
A Constituição define que a medida provisória deve atender a dois quesitos: relevância e urgência. Por entrar em vigor imediatamente, sem análise prévia, a Presidência da República precisa justificar esses critérios em documentos enviados aos parlamentares, chamados "exposição de motivos".
Esses ofícios são assinados pelo ministro da área relacionada à medida provisória. Em liberações de crédito, por exemplo, a descrição dos motivos cabe a Paulo Guedes. Em temas de direitos humanos, a exposição ficaria a cargo da ministra Damares Alves.