Os juízes da Vara de Ação Civil Pública e Ação Popular de Cuiabá, Luís Aparecido Bortolussi Júnior e Celia Regina Vidotti, mandaram exonerar mais três servidores da Assembleia Legislativa de Mato Grosso (AL-MT) que foram declarados estáveis no cargo – e que receberam promoções ao longo dos anos -, sem nem mesmo prestar concurso público. Um deles, E.J.L., é irmão do ex-deputado federal Eliene de Lima, e ocupa o cargo de técnico legislativo de nível superior (SB5), com salário de R$ 10.777,12.
De acordo com decisão da juíza Celia Regina Vidotti do último dia 19 de junho, E.J.L. ingressou como servidor da AL-MT em 1997. A legislação prevê a estabilidade a servidores que não prestaram concurso público somente se na data de promulgação da Constituição de 1988 (5 de outubro daquele ano) eles estivessem ocupando o cargo por pelo menos 5 anos ininterruptos. A juíza afirmou que este não foi o caso de E.J.L. “O requerido jamais poderia ser agraciado com a estabilidade extraordinária, uma vez que, quando da promulgação da Constituição Federal, em 05.10.1988, sequer figurava como funcionário da Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso”, disse ela.
Também no último dia 19 de junho, o juiz Luis Aparecido Bortolussi Junior determinou a anulação do ato que conferiu a estabilidade, além da efetivação no cargo, da técnica legislativa de nível médio (MD10), G.L.F.M. De acordo com informações do processo, ela ingressou na AL-MT em julho de 1985 – menos de cinco anos do tempo necessário exigido pela Legislação para usufruir do benefício. Ela, porém, alegou que trabalhava desde julho de 1982 na prefeitura de Luciara (1.180 km de Cuiabá).
Bortolussi rechaçou os argumentos, dizendo que, além da prefeitura de Luciara informar que não encontrou registros da vida funcional da servidora, também alegou que tanto a administração municipal, quanto o Poder Legislativo Estadual, são órgãos distintos e que o suposto tempo em que trabalhou na prefeitura não poderia ser utilizada no cômputo dos cincos anos mínimos necessários para a estabilização no cargo. Ela recebe salário de R$ 7.345,00.
“Verifico que a ré encontrava-se trabalhando na Assembleia Legislativa e contava com menos de 05 anos de serviço público prestado à referida Casa de Leis, uma vez que ingressou em 1º de julho 1985 [...] Por amor ao debate, ainda que fosse válido o tempo de serviço prestado na mencionada Prefeitura, este, por si só, não seria aproveitado na Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso para cômputo do prazo para preenchimento dos requisitos previstos no art. 19 do ADCT, por se tratarem de entes públicos autônomos e estanques”, disse o juiz.
Bortolussi também foi o responsável por decretar, no último dia 18 de junho, a ilegalidade do ato de estabilização e efetivação no cargo de A.O.S., técnico legislativo de nível médio (MD10), que também recebe R$ 7.345,00. Ele ingressou na AL-MT no dia 1º de junho de 1984, tempo insuficiente para ser beneficiado.
“Nesse contexto, em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, consoante o controle de vida funcional fornecido pela Assembleia Legislativa, verifico que o réu encontrava-se trabalhando na Assembleia Legislativa do Estado de Mato Grosso e contava com menos de 05 anos de serviço público prestado à referida Casa de Leis, uma vez que ingressou em 1º de junho 1984, ou seja, apenas 4 anos, 3 meses e 4 dias antes da promulgação da Constituição”.
ADCT
Os Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) foram regras estabelecidas para assegurar a “harmonia” na transição entre as Constituições de 1969 e 1988, e disciplina em seu art. 19 que os servidores públicos federais, estaduais e municipais, que estivessem exercendo o cargo por no mínimo 5 anos contínuos na data de promulgação da Constituição de 1988 (5 de outubro de 1988), seriam considerados “estáveis” no serviço público, beneficiando-se, entre outros direitos, de serem demitidos só após processo administrativo.
A regra foi uma forma de afastar a possível insegurança jurídica – circunstâncias judiciais que podem ser questionadas dadas as suas “fragilidades” em relação ao que estabelece a legislação -, e foi introduzida na Constituição de 1988 para manter os servidores públicos que exerciam seus cargos mesmo sem a realização de concurso público.
A norma, porém, não garante "ingresso" à carreira no serviço público, apenas a estabilidade no cargo, o que impede que progressões sejam feitas por esses trabalhadores, como o aumento de salário pela ocupação de novos postos, caso dos três servidores, que mesmo que tivessem o direito à estabilidade, não poderiam ingressar nas carreiras de técnico legislativo.